Grupos focais, ou grupos de discussão, são uma das melhores técnicas de análise qualitativa em pesquisa de mercado. Embora tenham migrado para o ambiente virtual (essencialmente mantendo a mesma dinâmica), na minha opinião, continuam sendo a melhor técnica para uma análise aprofundada. Então, qual seria a amostra do grupo focal?
Partindo do princípio de que, se você chegou até aqui, já sabe o que são grupos focais, não vou me alongar sobre sua natureza.
Se há um fator que impacta diretamente os resultados desse tipo de pesquisa e sua confiabilidade, é a seleção da amostra ou unidade de análise, sobre a qual recai todo o trabalho de aprendizado de um fenômeno social.
Não é segredo para ninguém o quanto essa técnica de pesquisa pode ser cara quando realizada offline, ainda mais devido ao enorme esforço necessário para recrutar os perfis certos, conduzir o estudo e preparar o local com as condições ideais.
Antes de avançarmos para o tema em questão, vamos revisar brevemente o “quando” da pesquisa com grupos focais. Essa decisão não deve se basear apenas em critérios de investimento, mas também em uma necessidade bem diagnosticada e relevante no momento de optar por essa técnica.
Quando devemos usar um grupo focal?
Nem tudo na pesquisa de mercado precisa ser medido quantitativamente. De fato, há muitos fenômenos para os quais a análise quantitativa não pode nos oferecer respostas convincentes ou adequadas, tornando necessário recorrer à análise qualitativa.
Mas o oposto também acontece: muitos estudos qualitativos precisam ser complementados por pesquisas quantitativas para serem concluídos. No jargão acadêmico europeu, isso é conhecido como pesquisa multiestratégica ou pesquisa 360°, quando combinamos ambas as abordagens.
Meu conselho é adaptar o tipo de estudo ao fenômeno que você deseja entender e buscar uma visão completa da pesquisa, utilizando tanto a análise qualitativa quanto a quantitativa quando necessário.
Escolhemos grupos de discussão quando:
- O produto ou serviço ainda não existe. Embora seja menos comum, já que a maioria dos produtos e serviços busca apenas diferenciação e um público-alvo mais específico, há invenções que precisam, no mínimo, compreender como serão percebidas em determinado mercado. Pense em patentes ou em períodos anteriores ao surgimento do PC ou dos automóveis.
- O público-alvo é difícil de alcançar ou segmentar e não costuma estar disponível em painéis de consumidores. Isso se aplica a produtos de alta qualidade ou altamente complexos, que exigem conhecimento específico para avaliar sua eficácia. Imagine, por exemplo, produtos consumidos na Estação Espacial Internacional por astronautas ou cirurgiões comprando um conjunto de bisturis com ponta de diamante.
- Gostaríamos de refinar um questionário por meio de um painel de especialistas. Isso ocorre quando queremos entender a opinião dos líderes de um determinado setor da economia e, ao mesmo tempo, corrigir ou validar as perguntas do instrumento.
- Não buscamos informações em termos de porcentagens ou probabilidades, mas sim compreender os fatores que influenciam a tomada de decisão e certas questões culturais dos consumidores.
- A pesquisa ou o questionário, por si só, não são suficientes, pois há aspectos que só podem ser explorados por meio de entrevistas.
- Queremos conduzir estudos etnometodológicos ou biográficos para entender como determinado fenômeno é interpretado a partir da experiência vivida ou da expertise dos participantes.
- As pesquisas de satisfação falham e já não fornecem resultados confiáveis.
- Temos usuários viciados ou especialistas em responder pesquisas, o que dificulta a obtenção de insights reais sobre uma determinada realidade problemática.
Critérios de seleção para uma amostra em grupos focais
Estes são alguns critérios que você deve levar em consideração antes de selecionar a amostra para o seu grupo focal.
É essencial entender que buscamos compreender como certas pessoas pensam ou reagem a um fato específico (produtos, serviços, matrizes de opinião etc.), e que a unidade de análise por excelência é o discurso dos participantes.
Embora existam outras unidades de análise enriquecedoras, como gestos, tom de voz e reações a imagens, os resultados de grupos focais não podem ser considerados estatisticamente replicáveis para a sociedade como um todo, como ocorre em estudos quantitativos.
O que deve ficar claro é que os resultados pertencem a uma unidade que os sociólogos chamam de microanálise social. Pesquisas de mercado que apresentam porcentagens e probabilidades como resultados de uma técnica qualitativa, como o grupo focal, devem ter sua expertise questionada. O que se obtém são unidades discursivas ou temas de análise, que possuem uma frequência de aparição.
Por exemplo, em uma sessão com doze participantes, a frequência temática poderia ser de 2/12, 4/12 ou 10/12, entre outras possibilidades. Quanto maior a frequência de um tema, mais forte se torna o argumento, mas isso não significa que 40% ou 76% dos entrevistados disseram algo específico.
Validade e confiabilidade
Para que a amostra seja significativa em grupos focais, ela deve estar alinhada ao objetivo do estudo. Em outras palavras, se o foco da pesquisa for oficinas mecânicas, donas de casa não devem compor o grupo, a menos que tenham relação direta com o tema.
Os discursos devem ser coerentes e relevantes, ainda que, eventualmente, algumas pessoas tragam opiniões desconectadas do tema. O normal é que, ao longo da sessão, elas retomem a lógica da discussão e contribuam com insights alinhados ao esperado.
Os grupos focais devem ser convergentes e preditivos, ou seja, durante as sessões, devemos observar comportamentos esperados no momento da pesquisa, ao mesmo tempo em que buscamos confirmar tendências futuras.
Por exemplo, esperamos que enfermeiros compartilhem opiniões semelhantes sobre um determinado curso de ação. No entanto, se lhes perguntarmos sobre como ir à Lua, é natural que não tenham uma resposta embasada.
Outro fator que valida a confiabilidade dos grupos focais é a existência de grupos de controle. Isso significa que, além das sessões regulares, podemos realizar testes adicionais para verificar se os resultados se mantêm consistentes em outro grupo designado para essa finalidade.
O ponto de saturação
O ponto de saturação é um fenômeno específico dos grupos focais que surge da própria interação entre os participantes. Ele ocorre quando, após determinado tempo de discussão, os mesmos argumentos e justificativas começam a se repetir.
Esse fenômeno não acontece apenas dentro de uma única sessão, mas também em repetições da técnica para o mesmo fenômeno estudado. O mais importante é identificar esse momento para, então, mudar o foco para um novo bloco de temas ou, caso os objetivos da pesquisa já tenham sido atingidos, encerrar as sessões.
Assuntos ou unidades amostrais
O primeiro passo é delimitar o campo ou a população que será estudada. Quando falamos de universo em grupos focais, nos referimos ao público-alvo, de onde selecionamos as unidades amostrais, ou seja, as pessoas que serão recrutadas para a pesquisa e que atendem aos critérios estabelecidos.
Para definir esse nível de amostragem, é fundamental enquadrá-lo em um espaço e um período de tempo, pois esse tipo de pesquisa representa uma fotografia contextualizada de um momento específico e não necessariamente um estudo em tempo real.
Por fim, também podemos decidir se a seleção das unidades amostrais será feita de forma estratificada (segmentando os participantes por critérios específicos) ou não estratificada (seleção mais ampla e sem subdivisões rígidas).
Critérios de segmentação para um grupo focal
Como mencionado, a entrevista é o principal instrumento para a coleta de dados em grupos focais, e seu registro é essencial. É importante lembrar que, a menos que sejam adicionados outros critérios, o foco principal recai sobre o discurso dos participantes. Esse discurso deve representar indivíduos que atendam a determinados critérios, como:
a. Variáveis sociodemográficas
- Gênero
- Classe social
- Status
- Idade
- Outros fatores relevantes para o estudo
b. Compatibilidade
A compatibilidade entre os participantes é um critério essencial, pois pode impactar tanto a fluidez da discussão quanto a sinceridade e autenticidade das respostas. Alguns aspectos importantes incluem:
- Língua e códigos socioculturais: Diferenças linguísticas ou culturais podem dificultar a comunicação e influenciar a compreensão das respostas.
- Hierarquia: Sessões com pais e filhos, chefes e subordinados ou outras relações de autoridade podem inibir a livre expressão dos participantes.
- Nível de escolaridade: Diferenças muito grandes no nível educacional podem afetar a dinâmica da discussão e comprometer a obtenção de insights relevantes.
- Religião: Diferentes crenças religiosas podem influenciar formas de expressão, vestimenta e até mesmo a interpretação do tema em discussão. Em alguns casos, isso pode gerar distorções ou vieses no discurso dos participantes.
c. Taxa compensatória
A taxa compensatória é um elemento essencial a ser considerado, pois busca equilibrar a participação dos indivíduos no grupo focal. O objetivo é garantir que todos os participantes tenham a oportunidade de se expressar plenamente, evitando que discursos dominantes ou posturas específicas limitem as contribuições dos demais.
Nesse sentido, o gênero pode influenciar a dinâmica do grupo. Por exemplo, para evitar que um menino adote uma postura de destaque excessivo (“efeito pavão”) em meio a muitas meninas, é recomendável equilibrar a composição do grupo, inserindo um participante que neutralize esse efeito.
No entanto, é importante ter cuidado, pois a compensação excessiva pode gerar sobreposição de influências, não apenas em termos de gênero, mas também em relação a papéis sociais e status dos participantes.
d. Homogeneidade e heterogeneidade
Os critérios de segmentação mencionados anteriormente já auxiliam nessa questão, mas a consideração da homogeneidade e heterogeneidade torna-se ainda mais relevante quando há múltiplas sessões de grupo focal.
Em estudos mais complexos e abrangentes, especialmente aqueles que exigem deslocamento para diferentes regiões do país, é fundamental garantir heterogeneidade intragrupo (HI) e heterogeneidade intergrupo (HE). Isso significa que os grupos devem ser diversos não apenas dentro de uma mesma sessão, mas também entre as diferentes sessões realizadas.
Essa abordagem amplia a riqueza dos insights obtidos e reduz o risco de saturação, garantindo uma análise mais completa e representativa.
Espero que essas linhas de trabalho tenham servido para orientá-lo melhor em relação à amostra em grupos focais e para orientá-lo na utilização dela como técnica de análise e coleta de dados.
Autor: Dagoberto Itriago é Market & Customer Intelligence na ERA Group – uma empresa de pesquisa de mercado online sediada em Barcelona, Espanha e Monterrey, México, um trabalho que ele combina com consultoria e treinamento em áreas de marketing estratégico e pesquisa de mercado.